Algas existentes nos penedos da praia da Tamargueira, em Buarcos, Figueira da Foz, estão na base de um projeto, hoje apresentado, que inclui sopas, pratos salgados e sobremesas, coordenado por uma investigadora da Universidade de Coimbra (UC).
A iniciativa, intitulada “MENU – O projeto que oferece refeições nutritivas e saudáveis com macroalgas da costa portuguesa”, decorreu durante três anos e passou por diversas fases, desde a colheita de exemplares juvenis de algas nos baixios de Buarcos, passando pelo seu desenvolvimento controlado em laboratório, até ao crescimento em aquacultura para chegarem às quantidades necessárias à produção das refeições.
“Durante todos estas fases, desde a recolha, ao cultivo, até ao produto final, analisamos toda a composição nutricional das algas, para termos a certeza de que, realmente, ao longo do processo, não há perda desse valor nutricional”, disse à agência Lusa Ana Marta Gonçalves, coordenadora do projeto.
De acordo com informação disponibilizada pela equipa de investigação – que envolveu o Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), do Departamento de Ciências da Vida da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) e o laboratório Marefoz que lhe está associado, para além da parceria com a Universidade de Aveiro, a aquacultura Lusalgae e a centenária empresa de produção de arroz Ernesto Morgado – foram selecionados dez tipos de macroalgas e produzidas outras tantas variedades de refeições, doces e salgadas.
O menu resultante do projeto inclui as algas em pratos como arroz integral e arroz de tomate, uma sopa em versão creme, frango com molho de tomate ou com cogumelos, pescada em molho de algas, pudins (de baunilha, chocolate ou amêndoa), gelatinas de framboesa e morango, mousses de chocolate e de baunilha, e arroz-doce.
Questionada sobre a possibilidade de ser considerado um ‘sacrilégio’ a junção de algas ao arroz-doce português, Ana Marta Gonçalves destacou o “cuidado” da equipa de desenvolvimento em não incluir nas novas receitas os ingredientes habitualmente usados no arroz-doce dito tradicional.
“Nem no pudim ou na gelatina”, notou a investigadora.
Os ingredientes utilizados, para além do arroz, são, para já, reservados, dado estar a decorrer um processo de patentes das novas refeições e, por isso, não poderem ser divulgados.
“Chamamos pudim e mousse, porque têm realmente esse sabor e essa consistência e queremos estar próximos desses produtos. Mas temos o cuidado de identificar os ingredientes em que o principal são as macroalgas, que usamos como um todo, para poder ir buscar as propriedades que as algas têm, mas são ingredientes completamente diferentes daqueles que se usam normalmente, para que as refeições possam também chegar a um consumidor vegan ou uma pessoa que possa ter problemas de diabetes”, observou Ana Marta Gonçalves.
Acrescentou ainda que os doces “não levam açúcar refinado” e que os investigadores não quiseram usar muitos ingredientes, também para não encarecer o produto final, que, esperam, venha a ser desenvolvido e comercializado por empresas para poder chegar ao consumidor final, já tendo existido contactos nesse sentido.
Quanto ao sabor, as refeições à base de algas “tem o sabor de uma mousse, um pudim, uma gelatina ou o arroz-doce”, garantiu.
“As pessoas, quando vão provar, têm sempre a expectativa de que vai saber a alga ou ter sabor de maresia, mas depois ficam admiradas porque não tem”, frisou a investigadora.
Ana Marta Gonçalves admitiu uma preferência pessoal pela mousse de chocolate e pelas gelatinas, ressalvando, no entanto, gostar de “todas” as refeições.
“São todas bastante interessantes e gosto do sabor final de todas elas, são todas muito boas”, enfatizou.
Ao longo dos três anos que durou o projeto – hoje concluído com um evento final de apresentação de resultados e degustação das refeições, na Figueira da Foz – houve vários momentos de contacto do público com os pratos em desenvolvimento, nomeadamente em escolas de todo o país, numa iniciativa lançada o ano passado por ocasião do Dia Mundial da Alimentação – que se celebra em outubro – mas que acabou por se estender por quase oito meses.
Os destinatários foram alunos do ensino básico e secundário (dos 5.º ao 12.º anos de escolaridade) e Ana Marta Gonçalves destacou a “enorme recetividade” que os investigadores encontraram nas escolas.
“Ter estudantes que dizem que gostariam de ter estes produtos nas cantinas da sua escola mostram que estão abertos e recetivos e que gostaram da degustação que fizeram”, afirmou.
Para além das refeições, o projeto MENU produziu uma película de proteção de alimentos à base de algas, de modo que estes possam estar mais tempo em prateleiras de superfícies comerciais.
Este produto suscitou o interesse de uma empresa portuguesa de queijos localizada em Esposende, distrito de Braga, revelou Ana Marta Gonçalves.
“Estas películas não dão sabor nem cheiro e não alteram qualquer propriedade do queijo. E, sendo à base de macroalgas, é um produto natural que, depois, pode ser consumido diretamente com o queijo, neste caso, o produto que está a revestir”, explicou a investigadora da FCTUC.